As investigações sobre a psicogênese da língua escrita permitem ao professor atuar como um mediador eficaz no processo ensino-aprendizagem.
Objetivos:
★ Mapear o conhecimento das crianças em relação à escrita.
★ Reorientar sua prática pedagógica.
★ Coletar material para definir as possíveis intervenções.
★ Elaborar o planejamento, propondo situações capazes de gerar novos avanços na aprendizagem das crianças.
★ Obter dados sobre o processo de aprendizagem de cada aluno.
★ Verificar periodicamente seus avanços.
★ Formular indicadores que permitam dar uma visão da evolução da hipótese de escrita da criança ao longo do ano letivo.
Faixa etária:
Crianças do 1° e 2° ano.
Considerando que no atual Ensino Fundamental de nove anos, o primeiro ano não se destina unicamente à alfabetização, porque ele é tido como uma possibilidade real para qualificar o ensino e a aprendizagem dos conteúdos tanto da alfabetização quanto do letramento, logo no início do segundo bimestre, faz-se fundamental realizar uma avaliação diagnóstica (ou sondagem da escrita) para constatar o que as crianças já sabem ou aprenderam desde o início do ano letivo. Com esse processo, a partir das pistas obtidas, o professor passa a conhecer as hipóteses de escrita elaboradas pelos próprios alunos e, dessa forma, poderá planejar atividades mais significativas e ainda organizar duplas e grupos de acordo com as necessidades de cada criança.
Sobre a necessidade da sondagem
Com o ensino fundamental de nove anos, diferentes crianças são reunidas na mesma sala de aula e, entre elas, algumas já tiveram um contato concreto com as letras e até com a escrita, enquanto outras ainda não – embora já tenham um padrão inconsciente sobre ambas as coisas. Logo, se o objetivo é estimular a aprendizagem infantil, diante da diversidade, torna-se essencial ter um parâmetro para desenvolver o trabalho de letramento e de alfabetização.
Como subsídio para o professor, ela se destaca como um instrumento para analisar as hipóteses de grafia infantil durante atividades lúdicas, que coloca a criança diretamente em contato com desafios da escrita. Consequentemente, a sondagem que deve ser feita individualmente, sempre com palavras e atividades inéditas, possibilita:
★ Conhecer o que a criança pensa de forma geral sobre a escrita;
★ Saber qual a lógica que ela utiliza no momento de escrever;
★ Perceber se ela sabe por que está escrevendo e para que está escrevendo.
Elas podem ser classificadas em:
Pré-silábica: subdividida em dois níveis, nessa fase, a criança não traça o papel com a intenção de realizar o registro sonoro do que foi proposto para a escrita:
a) Nível 1 – Ela apresenta baixa diferenciação entre a grafia de uma palavra e outra, por isso costuma escrever palavras de acordo com o tamanho do que está representando. Seus traços são semelhantes entre si e, muitas vezes, nem ela consegue identificar o que escreveu – leitura instável. Algumas vezes, usa como estratégia o pareamento de desenhos com as palavras – para poder ler com mais segurança -, o que também pode caracterizar certa insegurança ao decidir que letras usar. Essa dificuldade acontece porque ela ainda não compreendeu a função da escrita e ainda confunde a escrita com desenhos.
b) Nível 2 – Embora já saiba que há uma quantidade mínima de caracteres e que seu emprego é necessário para a escrita, a criança ainda tenta criar diferenciações entre os grafismos produzidos, a partir do arranjo das letras que conhece (por poucas que sejam), mas sua escrita continua não analisável.
Hipótese silábica: ela começa estabelecer relações entre o contexto sonoro da linguagem e o contexto gráfico do registro. Sua estratégia é a de atribuir a cada letra ou marca escrita (uma letra, pseudoletra ou até um número) o registro de uma sílaba falada, pois começa a perceber que a grafia representa partes sonoras da fala. No entanto, ainda enxerta letras no meio ou final das palavras por acreditar que, assim, está escrevendo corretamente. Nessa fase, seu maior conflito são as palavras monossílabas – para ela é necessário um número mínimo de letras para cada palavra.
Hipótese silábico-alfabética: como a criança utiliza ambas as hipóteses de escrita (pré-silábica e silábica) ao mesmo tempo, ela vivencia um momento de transição. Nessa fase, os avanços só podem ocorrer mediante informações que possibilitem o refinamento da aprendizagem relativa ao valor sonoro convencional das letras, além de oportunidades de comparação dos diversos modos de interpretação da mesma escrita.
Hipótese alfabética: ela já venceu todos os obstáculos conceituais para a compreensão da escrita – cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a sílaba – e realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai escrever. Também já perdeu o medo de escrever (que ocorre com a maioria das crianças quando iniciam a escolaridade), contudo ainda não domina as regras normativas da ortografia. Apesar dessa subdivisão, o tempo necessário para a criança avançar de um nível para outro varia muito. Mas sua evolução pode ser facilitada pela atuação significativa do professor, que deve estar sempre atento às necessidades observadas em seu desempenho, para lhe propor atividades adequadas que a conduzirão ao nível seguinte. Logo, o processo de alfabetização não é imediato, ele tem diversas etapas e se dará ao longo dos anos subsequentes do Ensino Fundamental.
A inclusão do nome próprio nas atividades
O nome constitui uma palavra-texto, com grau de significação ímpar, pois ele contém toda a história da criança. Portanto, é pouco provável que algum aluno, ao se apoderar do processo da escrita, não expresse forte desejo de colocá-lo em todo espaço possível. Partindo dessa concepção, o não atendimento desse desejo implica em lançar fora um recurso valioso no envolvimento da criança com o código da língua escrita.
Para acompanhar as etapas de evolução e aprendizagem de cada criança, a avaliação diagnóstica deve ser feita com regularidade – uma vez a cada 15 dias ou uma vez por mês. Durante a aplicação do processo, apenas dite para que os alunos possam escrever da maneira que acreditam ser a correta. Nunca interfira na grafia de nenhum deles, pois é a análise da forma individual de escrever que determina o nível em que cada criança se encontra e seus consequentes avanços.
Uma das principais consequências da absorção da psicogênese da língua escrita na alfabetização é a recusa ao uso das cartilhas que, segundo Emilia Ferreiro, oferecem um universo artificial e desinteressante às crianças. Portanto, a compreensão da função social da escrita deve ser estimulada com o uso de textos da atualidade, livros, histórias, jornais, revistas etc.
Anote!
Após a avaliação da primeira sondagem, divida a criançada de acordo com o nível apresentado e, então, passe a aplicar as sugestões de atividades que seguem – tanto aqui quanto na seção de Português -, para agilizar o processo de aprendizagem. Mas observe o desempenho de cada uma delas durante os exercícios e se, necessário, dedique alguns minutos a algumas, preferencialmente de forma individual. Após a segunda sondagem, para obter sucesso no processo, remaneje os grupos conforme a evolução individual dos alunos.
Como ela se dá por meio da percepção (capacidade de discriminar sons e sinais, por exemplo) e da motricidade (coordenação, orientação espacial etc.) infantil, o ato de saber desenhar as letras deve se desenvolver em conjunto com a compreensão da natureza da escrita e sua organização.
★ Entregue uma folha de sulfite ou pautada para cada aluno e, então, peça para cada qual colocar o seu nome (é conveniente identificar as folhas antes ou após a sondagem para saber corretamente a quem ela pertence).
★ Em seguida, dite algumas palavras para que possam escrever.
★ Depois, solicite individualmente que façam a leitura da palavra, apontando com o dedo o que foi escrito.
★ No término da primeira sondagem, registre em uma ficha (tem um exemplo que pode ser xerografado no pôster) a forma como o aluno leu (global ou silabicamente), a fase de escrita em que ele se encontra e outras informações importantes.
★ Guarde a ficha até a próxima sondagem, repita novamente o procedimento e, na sequência, registro os avanços dos alunos.
Quando apresentados por crianças de classes sociais diferentes durante a alfabetização, eles não revelam capacidades desiguais, mas o acesso maior ou menor a textos lidos e escritos desde os primeiros anos de vida. Logo, vale a pena ressaltar que, em seus estudos, tanto Emília Ferreiro quanto a pedagoga espanhola Ana Teberosky encontraram crianças que mostram uma sequência de três níveis evolutivos; em outras, uma sequência de apenas dois níveis – por exemplo, do pré-silábico ao silábico, ou do pré-silábico ao silábico alfabético, saltando um deles – ou, ainda, em menor número, crianças que passam diretamente do nível pré-silábico ao alfabético.
Sugestões de atividades para o nível pré-silábico:
★ Liste o nome de todas as crianças no quadro ou em cartazes.
★ Faça com que cada aluno identifique seu nome e, depois, o de cada colega, para que eles percebam que nomes maiores podem pertencer às crianças menores e vice-versa.
★ Classifique os nomes pelo som inicial, em ordem alfabética ou em galerias ilustradas com retratos ou desenhos.
★ Crie e aplique jogos com nomes (dominó, memória, boliche, bingo etc.).
★ Peça para a criançada fazer a contagem das letras e o confronto dos nomes.
★ Confeccione junto a eles gráficos de colunas com os nomes seriados em ordem de tamanho (número de letras).
★ Repita essas mesmas atividades, utilizando palavras do universo dos alunos, tais como rótulos de produtos ou recortes de revistas (propagandas, títulos, palavras conhecidas etc.).
★ Após desenvolver esse trabalho em sala de aula, aplique essas sugestões durante a sondagem.
Sugestões de atividades para nível silábico em diante
★ Organizar listas de palavras com o mesmo tema (animais, flores, alunos ausentes etc.), que deve ser iniciada com as palavras polissílabas, depois trissílabas, dissílabas, monossílabas e, por último, uma frase com referência ao campo semântico utilizado (por exemplo: dinossauro, girafa, vaca, boi / a vaca está pastando). Em seguida, dite essas mesmas palavras para que as crianças as escrevam.
★ Introduza jogos e brincadeiras com palavras (forca, cruzadinhas, caça-palavras etc.).
★ Em conjunto com as crianças, elabore um dicionário ilustrado (com desenhos, adesivos ou recortes de revistas) com as palavras aprendidas.
★ Sugira que elas façam um diário da turma, relatórios de atividades ou projetos com ilustrações e legendas.
★ Proponha atividades em dupla (um dita e outro escreve), a reescrita de histórias, pesquisas de canções, parlendas e trava-línguas.
★ Após desenvolver esse trabalho em sala de aula, aplique essas sugestões durante a sondagem.
Para saber mais:
-Psicogênese da Língua Escrita, de Emilia Ferreiro (Editora Artmed).
-Alfabetização: a Criança e a Linguagem Escrita, de Cláudia Maria Mendes Gontijo (Editora Autores Associados).
-Reflexões sobre Alfabetização, de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (Editora Cortez).
-A Formação Social da Mente: o Desenvolvimento dos Processos Psicológicos Superiores, de L. S. Vigostsky (Editora Martins Fontes).
-Os Processos de Leitura e Escrita, de Emilia Ferreiro e Margarita Gomes Palácio (Editora Artmed).
-Contextos de Alfabetização Inicial, de Ana Teberosky e Marta Soler Gallart (Editora. Artmed).
-Desenvolvimento da Escrita – 100 Propostas Práticas para o Trabalho com Crianças de Seis Anos, de Geraldo Peçanha de Almeida (Editora Wak).