PRO LETRAMENTO – Aula 10


PRO LETRAMENTO – Aula 10

c) Considerando a morfologia – Há ainda algumas dificuldades ortográficas que podem ser sistematizadas e tornadas mais fáceis para os alunos com a ajuda de conhecimentos da morfologia da língua, ou seja, a compreensão de como são formadas as palavras, ao longo da história. Por exemplo: em todos os substantivos abstratos que expressam qualidades e são derivados de adjetivos, como beleza, pobreza, riqueza, tristeza, aparece o sufixo -eza, que é sempre escrito com Z. O sufixo -ez, de rapidez, gravidez, escassez, também é sempre escrito com Z. A terminação de todos os verbos, sem exceção, conjugados no imperfeito do subjuntivo, é -sse (tivesse, pudesse, quisesse, lavasse, brincasse, vendesse, sorrisse, saísse). Uma das grafias que mais traz embaraços, sobretudo aos aprendizes iniciantes, são os ditongos finais /ew/, /iw/, /ow/, que as crianças vêem escritos ora com U, ora com L (gol/pegou; anel/céu; Brasil/partiu). Essa dificuldade pode ser bastante amenizada com a compreensão de que a terminação de todos os verbos, sem exceção, no pretérito perfeito, é sempre com U (pegou, lavou, vendeu, comeu, sorriu, caiu). Deve-se ressaltar que, para se lidar com essas regularidades nos anos iniciais da alfabetização, não é necessário envolver os alunos na
memorização de conceitos gramaticais, como substantivo, verbo, sufixo ou terminação. É perfeitamente possível e proveitoso trabalhar com esses casos recorrendo aos conhecimentos lingüísticos intuitivos dos alunos e lidando com muitos exemplos e com formulações simplificadas.

A partir da análise dos exemplos acima, pode-se afirmar que fazem parte da aprendizagem do aluno a compreensão e o domínio das regras que organizam as relações entre grafemas e fonemas em nosso sistema da escrita. Mas, pela complexidade da tarefa, não se pode esperar que ele descubra sozinho a chave do segredo. O trabalho pedagógico atento, explícito e sistemático é fundamental na orientação do aprendizado, e pode tornar efetivo o domínio das regularidades ortográficas até o 3º ano da Educação Fundamental.
No Quadro 2, o sombreado e as letras nas linhas relativas ao domínio das regularidades ortográficas correspondem à sugestão de que esses conhecimentos sejam apenas introduzidos no 1º ano e trabalhados sistematicamente, com vistas à consolidação, nos dois anos seguintes.

(ii) Dominar irregularidades ortográficas 
As maiores dificuldades para o aprendiz dominar o sistema ortográfico do português se devem ao fato de haver, por um lado, fonemas que, mesmo quando em contextos idênticos, podem ser representados por diferentes grafemas, e, por outro lado, casos em que um mesmo grafema, também em contextos idênticos, pode corresponder a diferentes fonemas. Esses casos são
difíceis pela impossibilidade de se formular uma regra geral, já que não há como buscar apoio nem na posição nem no contexto.

O caso mais difícil, do primeiro tipo (um fonema/vários grafemas) é o do fonema /s/ antes de vogal, que tem o maior número de possibilidades de representação escrita na língua portuguesa.
No começo de palavras, este fonema pode ser grafado com a letra S (sapo, segredo, sina, sopapo, subida) e, diante de /e/ e /i/, também pela letra C (cego, ciranda). Em sílabas de meio de palavras, aumentam as possibilidades de grafia: entre vogais, o fonema /s/ pode ser escrito com C (oceano), com SS (ossada), com XC (exceto), com Ç (espaço), com SC (nascimento); antes de vogal e depois das letras N e L, o fonema /s/ pode ser escrito com o grafema C (vencem, calcem), ou S (pensem, ensaboar, valsa), ou Ç (abençoar, dançar, calça). Por sua vez, o grafema X é um bom exemplo do segundo tipo (um grafema representando vários fonemas). Entre vogais, ele pode corresponder a /z/ (exame, exemplo, executar, exíguo, êxodo) ou a /ks/ (sufixo, táxi, reflexo).
Para a criança que está aprendendo: como escrever severo, sina, cebola, cidade? Como ler exame e vexame?
Muitas dessas grafias serão aprendidas por memorização, sobretudo em função da alta freqüência das palavras nos textos escritos que as crianças vão ler e escrever, porque as palavras de conteúdo (substantivos, adjetivos, verbos, por exemplo) mais freqüentes normalmente são aquelas que fazem sentido, que são necessárias e compreendidas. Vê-se aqui, mais uma vez, a importância de integrar ao aprendizado do código escrito e da ortografia a
dimensão semântica da língua. O professor ou a professora pode contribuir apontando esses casos, dirigindo para eles a atenção e a memória dos alunos. 
É possível promover jogos ortográficos, como palavras cruzadas, desafios, charadas, caça palavras, com palavras cuja grafia precisa ser memorizada. Sobretudo é importante deixar os alunos em alerta para as grafias que podem lhes trazer dificuldades e estimulá-los a procurar a solução de suas dúvidas no dicionário ou na consulta aos professores, aos colegas, a outros adultos. Se as crianças puderem ter acesso ao computador, uma boa situação de aprendizado é escrever com o “corretor ortográfico” acionado. Na tela do computador, as palavras escritas em desacordo com as regras ortográficas que o programa conhece são sempre sublinhadas de vermelho, o que leva o aluno a se perguntar qual foi o erro cometido e como pode corrigi-lo.

Nessa situação, o professor ou a professora precisará acompanhar atentamente as crianças, porque pode acontecer de o programa sublinhar uma palavra não porque ela tenha sido escrita incorretamente, mas simplesmente porque ela não consta do seu dicionário. Pode acontecer também de o programa não marcar uma palavra porque ela pode ser escrita de duas formas
diferentes, resultando em significados diferentes, como é o caso de ‘concerto’ e ‘conserto’. Ou seja, no trabalho com a ortografia, o computador pode ser um aliado, mas não dispensa, de modo algum, o saber e a atenção do professor ou da professora.
No Quadro 2, o sombreamento e as letras usadas estão indicando que se considera adequado começar a lidar apenas preliminarmente com as irregularidades da ortografia no 1º ano e trabalhá-las sistematicamente, buscando consolidação, só a partir do 2º ano. Diante da complexidade dos casos examinados, que estão longe de esgotar a questão, é de se esperar que
algumas dificuldades ortográficas permaneçam mesmo ao final dos anos iniciais da alfabetização e que tenham que ser retomadas nos anos posteriores. O mais importante é que o professor ou a professora procure estudar e ter clareza sobre as particularidades de cada tipo de problema, para saber distinguir os mais simples dos mais complicados, saber lidar com as
dificuldades específicas que cada caso envolve e, assim, poder conduzir adequadamente seu trabalho e dimensionar com equilíbrio suas expectativas.

Leitura

Nesta seção  estão focalizadas as capacidades específicas do domínio da leitura. A concepção de leitura que orienta a elaboração desta seção é a de que se trata de uma atividade que depende de processamento individual, mas se insere num contexto social e envolve disposições atitudinais, capacidades relativas à decifração do código escrito e capacidades relativas à compreensão, à produção de  sentido. A abordagem dada à leitura, aqui, abrange, portanto, desde capacidades necessárias ao processo de
alfabetização até aquelas que habilitam o aluno à participação ativa nas práticas sociais letradas, ou seja, aquelas que contribuem para o seu letramento.

Por isso, o Quadro 3 e os verbetes que se seguem retomam e desdobram alguns itens das seções anteriores, acrescentando a eles a indicação e a

descrição de capacidades particularmente necessárias à compreensão dos textos lidos.

Desenvolver atitudes e disposições favoráveis à leitura
A leitura é uma prática social que envolve atitudes, gestos e habilidades que são mobilizados pelo leitor, tanto no ato de leitura propriamente dito, como no que antecede a leitura e no que decorre dela. Assim, o sujeito demonstra conhecimentos de leitura quando sabe a função de um jornal, quando se informa sobre o que tem sido publicado, quando localiza pontos de acesso
público e privado aos textos impressos (bibliotecas), quando identifica pontos de compra de livros (livraria, bancas, etc.). Dizendo de outra forma, depois que um leitor realiza a leitura, os textos que leu vão determinar suas futuras escolhas de leitura, servirão de contraponto para outras leituras, etc.

Atitudes como gostar de ler e interessar-se pela leitura e pelos livros são construídas, para algumas pessoas, no espaço familiar e em outras esferas de convivência em que a escrita circula. Mas, para outros, é sobretudo na escola que este gosto pode ser incentivado. Para isso é importante que a criança perceba a leitura como um ato prazeroso e necessário e que tenha os
adultos como modelo. Nessa perspectiva, não é necessário que a criança espere aprender a ler para ter acesso ao prazer da leitura: pode acompanhar as leituras feitas por adultos, pode manusear livros e outros impressos, tentando “ler” ou adivinhar o que está escrito. 

Inserir-se nas práticas sociais próprias à cultura escrita implica comportamentos, procedimentos e destrezas típicos de quem vive no mundo da leitura, tais como: movimentar-se numa biblioteca, freqüentar livrarias, estar atento aos escritos urbanos e aos materiais escritos que circulam na escola. Implica também adquirir, quando se fizer necessário e quando

aparecerem novos usos para a leitura na sociedade, outras formas de ler.


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