PRO LETRAMENTO – Aula 25


PRO LETRAMENTO – Aula 25

Unidade II
Os tempos da escrita na sala de aula
Quanto tempo tem o tempo da escrita?
No tópico anterior, enfatizamos as atividades de leitura, destacando que nós, professores, lemos com as crianças e para as crianças em diferentes momentos do dia ou da semana e o fazemos de modos distintos e com interesses diversos. Essa diversidade de modos de ler e os interesses
implicados nas leituras imprimem a elas durações distintas. No fascículo seguinte serão abordados os temas da organização e uso da
biblioteca escolar e das salas de leitura e as muitas possibilidades de praticar a leitura na escola.
Com relação à escrita, também podemos dizer que se escreve bastante na escola, mas que é importante descrevermos o que se escreve, para quê, para
quem e como, pois só assim visualizaremos quais as práticas de escrita que de fato temos valorizado em nosso trabalho docente e que o tempo que
dedicamos a elas.

A exemplo do que fizemos com o tema leitura, analisemos três situações de escrita. A primeira delas é uma parte do depoimento de uma professora sobre sua história escolar. As duas outras são relatos de experiências desenvolvidas por professoras de 1ª série.

Esse depoimento chama nossa atenção para o fato de que as crianças chegam à escola desejosas de aprender, ansiosas por escrever e ler. Afinal, convivem com a escrita fora da escola, com maior ou menor intensidade, sabem de sua importância em nossa sociedade, sabem que têm algum conhecimento sobre ela, mas que também desconhecem muitos de seus segredos. Elas têm expectativa de que os adultos lhes ensinem e usem a escrita com elas.

No entanto, ao enfrentarem os exercícios rotineiros de cópia do alfabeto, sentem-se frustradas em suas expectativas, porque esse tipo de atividade é muito distante das funções comunicativas e expressivas da escrita que elas observam fora da escola.
Em suas experiências com as práticas sociais da escrita elas percebem que quem lê e escreve fora da escola, o faz com alguma finalidade, como registrar
idéias, documentar fatos, anotar lembretes, comunicar-se com alguém, etc. Assim sendo, é difícil para as crianças enxergarem na cópia do alfabeto algo além do que ela é: o aprendizado do traçado convencional das letras. Um aprendizado necessário, mas longe de ser suficiente para alguém que deseja ler e escrever.
Na falta de sentido imediato para o desejo de ler e escrever, a cópia se torna, aos olhos das crianças, perda de tempo, tarefa árdua que ocupa o tempo que
poderia ser dedicado às tentativas de ler e escrever. É um tipo de investimento, que quanto mais prolongado for durante o dia escolar, mais afasta a criança das práticas sociais de escrita.

Nessas condições, de acordo com o depoimento apresentado, a possibilidade de aprender a escrever na escola é vivida, pela criança, como desobediência. Experimentadas escondido da professora, nas brechas que sobram do tempo investido nas cópias, as atividades de ler e de escrever tornam-se para a criança uma aventura solitária e fugaz.

Em sua narrativa, a professora, cita alguns eventos que fazem parte da rotina de trabalho estabelecida com as crianças: a leitura coletiva em voz alta, a escrita de cartas pelas crianças na proposta de correspondência entre escolas e a ida à biblioteca.
Esse modo de referir-se à presença da leitura e da escrita no cotidiano de sua sala indicia que as práticas de escrita e de leitura orientam-se pelo uso real que ambas têm na vida das pessoas.

Sua rotina de trabalho não se reduz a exercícios ou lições de leitura e de
escrita que não são contextualizados. Em seu relato, a leitura de histórias,
o uso da biblioteca, a vivência de práticas reais com diferentes gêneros textuais — como a literatura e a carta — aparecem como atividades integradas ao seu trabalho pedagógico, que se tornam familiares para as crianças. Tão familiares a ponto de as crianças assumirem-se como leitoras.
Isso se evidencia no relato da professora, quando ela faz referência às cartas que as crianças escreveram sobre suas atividades na escola. Nessas cartas, elas destacam a importante presença da literatura no seu cotidiano e escolhem contar sobre as histórias narradas em sala.

Essa familiaridade que as crianças demonstram em relação à leitura nos
mostra como o acesso à biblioteca e a participação em momentos
coletivos de leitura favorecem e as levam a se aperceberem de que estão se apropriando dessa prática e de suas funções sociais.
Tanto, que elas se incluem como leitores, o que leva a professora a comentar, orgulhosa, em seu depoimento: Uma coisa que eu achei muito legal ter vindo deles é que eles disseram: “A gente lê”.
Seus dizeres indicam também que partes do seu tempo de trabalho diário em classe são dedicadas para ler e para escrever junto com as crianças, em práticas colaborativas que possibilitam a participação de todos os alunos, mesmo daqueles que ainda não dominam os aspectos mais técnicos da escrita.
Ao escreverem cartas com a ajuda da professora crianças experimentam-se na autoria do texto escrito, um texto que circula de fato e é lido por outra(s) pessoa(s), além da própria professora.
As cartas lidas e respondidas mobilizam, por sua vez, novos momentos de escrita, que sustentam e expandem suas experiências iniciais de escrita para o outro.


Nas vivências descritas pela professora, o princípio que também parece reger as atividades desenvolvidas por ela é a compreensão da leitura e da escrita como práticas sociais, colaborativas e situadas (variam segundo a situação em que se realizam as atividades de uso da língua escrita).
Como seus alunos ainda não escrevem convencionalmente e com maior habilidade, ela se torna escriba (escritora) do grupo. Nesse papel, ela não só vai organizando com as crianças o roteiro de entrevista e o texto resultante dela, como também vai compartilhando o próprio ato de escrever, pois um texto não é uma mera transcrição da fala: é uma forma de organização
das idéias. Assim, como interlocutora e escriba, a professora dá uma forma ao texto que resulta das anotações feitas durante a entrevista.
Ao ler para o grupo o texto produzido, a professora possibilita às crianças o exercício da revisão, discutindo a seqüência e os modos de dizer que nele aparecem, aprovando-o ou sugerindo mudanças.
O relato, tal qual está escrito, sugere que a professora, ao planejar com as crianças modos de ter acesso a suas histórias e de registrá-las, assume-se
como agente de letramento, promovendo com seus alunos a possibilidade de utilizarem a escrita em uma situação real de registro, documentação. Nessa
situação, as crianças estão em contato com regras e modelos de escrita e também com o seu uso social, tais como o registro da memória e da história.
Mais do que uma atividade isolada de produção textual, o projeto de registro e organização das histórias de vida das crianças é também uma atividade
de leitura, visto que a documentação produzida, ao longo de sua realização, e o registro final do trabalho, podem, além de constituir o acervo da biblioteca, ser também uma maneira de mobilizar a escola para a leitura e a escrita como atividades permanentes. Caso a escola não tenha uma biblioteca, o
registro final pode ser um material de leitura disponível na sala de aula.

Paramos na pagina 123 e prosseguimos amanhã.

Fonte: http://www.ensinandocomcarinho.com.br/


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